7 de setembro de 2009

O silêncio de Deus e a voz profética


Quando Deus não falou, o melhor que faço é estar calado. Ou então ter coragem de falar apenas em meu próprio nome. No silêncio de Deus é melhor falar como ateu sensato do que como profeta devoto, que põe na boca de Deus lindas palavras que ele não disse. No silêncio de Deus, o homem tem total direito à palavra. Mas tal direito deve ser exercido em nome do homem, correndo ele o risco de ser julgado pela História como homem. O problema é quando no silêncio de Deus, falamos em nome dele, ainda que digamos o que há de melhor em nosso sistematizações teológicas. Um aspecto interessante sobre os profetas, é que eles eram gente sem nenhuma investidura religiosa oficial. Assim, era na informalidade da vida que Deus estava falando aos poderes constituídos. A Palavra de Deus estava sendo trazida por gente simples. O julgamento dessa Palavra de Deus aos líderes constituídos da nação, não vinha da classe sacerdotal, muito bem organizada e profundamente comprometida com o rei. A Palavra de Deus quase sempre foi leiga na História. Deus nunca falou oficialmente. Ele sempre usou os leigos para se fazer ouvir. Ele usa pessoas leigas, porém intrépidas. A intrepidez dos profetas vinha do fato, de que eles eram pessoas profundamente vinculadas à realidade do pacto de Deus com seu povo. Eles conheciam a Deus e conheciam o povo de Deus. A comunhão do povo de Deus eram os elementos atualizadores da mensagem dos profetas. O fato de que as agonias do pobre, dos oprimidos, aflitos e necessitados, estavam sendo ouvidas pelas profetas com uma dor contemporânea, é que dava a eles a possibilidade de pregarem sempre algo novo. Os genuínos profetas não ocupavam um escritório de profeta, apenas apareciam na cena da vida, quando necessário. E mais: os grandes e relevantes profetas de Israel, não eram frutos das chamadas escolas de profetas da época. As escolas de profetas já eram um meio caminho para a institucionalização do ministério profético, o que, sem dúvida, veio a ser um grande mal em Israel. Ninguém aprende a ser profeta. E os que o foram ou são, quase sempre gostariam de ser outra coisa, menos profeta. Por isso, devo dizer que, viver o ministério profético na atualidade significará, possivelmente ter algo a dizer aos poderes oficiais e não-oficiais constituídos na sociedade secular à qual pertencemos, bem como à igreja como instituição que muitas vezes, à semelhança de Israel no passado, se afasta do Senhor e o trai, quando abençoa de maneira messianicamente apaixonada ou quando se relaciona de maneira oportunista com tais poderes (principalmente em um ano de eleição como este). Na vida de Jesus, vemo-lo confrontando tanto a “igreja” (no sentido de que Israel, era também assembléia do povo de Deus), como o Estado. O ministério profético de Jesus para com a “igreja” aparece também no seu enfrentamento da instituição religiosa em si mesma. Mas aqui, chegamos a um ponto de difícil aceitação. Isso porque nós evangélicos, aceitamos o juízo de Deus como podendo vir com força sobre a igreja católica. Mas sobre nós, nossos membros, nossos pastores, nossos mestres, nossos teólogos, nossas instituições, julgamos uma heresia tal pensamento. A igreja protestante – a difusa igreja evangélica – está exatamenteno ponto de petrificação do processo religioso, no qual Jesus encontrou o judaísmo dos seus dias. Mas não somos capazes de ver isso. Dessa forma devemos dizer que muito daquilo que Jesus disse aos religiosos dos seus dias, deveria ser ouvido por nós hoje com temos e tremor. Jesus proferiu discursos contra os religiosos hipócritas, desalmados, mentirosos, cínicos, legalistas e superficiais do seu tempo. A nossa questão deveria ser: será que isso não têm nada a ver conosco? Esquecemos de como Jesus abominou a teologia correta que não gerava correção das deformações religiosas (Mateus 23: 1-3), o legalismo que achatava a psique humana ( Mateus 23:4), a espiritualidade estereotipada e encenada no palco da fé (Mateus 23:5-7), os títulos eclesiásticos enfatuados e autoreinvidicados (Mateus 23:8-12), as teologias de estreitamento da Graça ( Mateus 23:13), as preces usadas como chantagem emocional para tirar dinheiro dos pobres ( Mateus 23:14), o proselitismo separatista e desalmado (Mateus 23:15), os jeitinhos teológicos dados para esvaziar os conteúdos de causas e pessoas a fim de se dar valor às coisas da religião (Mateus 23:16-22). Esquecemos de como Jesus detestava a inversão de valores na hierarquia dos mandamentos e sua importância (Mateus 23:23,24), de como odiava as aparências falsas e sem correspondência no interior do ser (Mateus 23:25-28), de como enxergava com despreso o busto dos profetas em praça pública, pelo fato de que eles só eram honrados, porque já não estavam mais vivos para incomodar os líderes religiosos (Mateus 23: 29-35). Esquecemos sobretudo que para Jesus, sempre que tais coisas acontecem, fosse no judaísmo, seja na igreja, o juízo divino não pode falhar: “Em verdade vos digo, que todas essas coisas, hão de vir sobre a presente geração” (Mateus 23:36). No Apocalipse, Jesus diz: “Eu sou aquele que sonda mente e coração e vos darei a cada um segundo as suas obras” (Apocalipse 2:23). As cartas às igrejas da Ásia nos falam da necessidade de que a igreja se arrepende de sua indiferença e arrogância (Ap. 2:4,5), do sincretismo e da impureza (Ap. 2:14,15), dos adultérios praticados com naturalidade no âmbito da comunidade por líderes da igreja (Ap. 2:20,21), e da soberba autoglorificante resultante de um sentimento de autonomia (Ap. 3:15-19). E isso foi escrito enquanto havia discípulos da primeira geração ainda vivos, como João. E hoje?

Escrito por Juber Donizete Gonçalves, do blog: Cristianismo Radical

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